Catadores sírios ajudam a lidar com a crise do lixo no Líbano
BEIRUTE, Líbano, 10 de novembro de 2016 (ACNUR) - Diante de um carrinho cheio de lixo, Gharam, de 36 anos, examina a pilha em busca de garrafas plásticas e caixas de papelão, em um centro de reciclagem em Ouzai, nos arredores de Beirute.
Gharam é uma das seis refugiadas sírias que receberam seu primeiro emprego remunerado no Recycle Beirut, um projeto libanês que visa contribuir para a solução da prolongada crise de resíduos que assola o Líbano desde 2015. A iniciativa também oferece oportunidades de trabalho aos refugiados sírios vulneráveis que vivem no país.
“Quando chegamos aqui, eu tinha que começar do zero com os meus filhos, sem marido e sem ter a quem recorrer. Mas quando eu comecei este trabalho, as coisas começaram a mudar”, diz Gharam, que assim como suas cinco colegas sírias, perdeu o marido na guerra civil que assola o país.
O Líbano já acolheu mais de um milhão de refugiados sírios registrados. Equivalente a quase um quarto da população do país, a pequena nação do Oriente Médio abriga mais refugiados per capita do que qualquer outro país do mundo.
“Estamos oferecendo um serviço social e ambiental ao mesmo tempo”.
O mercado de trabalho libanês não está aberto a estrangeiros em todos os setores, mas os refugiados sírios com residência são legalmente autorizados a trabalhar nos setores ambiental e de limpeza. No entanto, muitos sírios lutam para encontrar trabalho em meio a um número limitado de oportunidades de emprego.
“O projeto não só beneficia o Líbano ao contribuir para preservar o meio ambiente, mas também dá dignidade e uma chance para que os refugiados mais vulneráveis façam algo pela comunidade que os acolhe”, diz Mireille Girard, representante do ACNUR, a Agência da ONU para Refugiados, no Líbano.
“Essa empresa criativa e sólida deve ser encorajada e reconhecida. Eles veem soluções positivas para cada desafio”, acrescenta.
A irmã de Gharam, Ola, que também trabalha no centro de reciclagem, diz que o trabalho ajudou a dar à sua vida no exílio um novo significado. “Antes desse trabalho eu costumava passar meus dias sentada ociosamente. Sempre me sentia entediada e solitária. Mas meus dias têm um propósito agora, eu me sinto produtiva”.
Ola e Gharam ganham 20 dólares por dia para separar materiais recicláveis, como latas, papel e plástico, e organizá-los de acordo com tamanho e qualidade, antes de serem enviados para reciclagem em outros lugares do país.
“Parte do nosso projeto é criar oportunidades de trabalho para as comunidades libanesa e síria”, explica Kassem Kazak, co-fundador do Recycle Beirut. “Estamos tentando destacar algumas das oportunidades que surgiram em meio a crise, em vez de olhar para ela como um fenômeno exclusivamente negativo”.
O Líbano enfrenta enormes desafios ambientais. Uma crise do lixo estourou no verão passado após o fechamento do principal aterro do país. Com lixo acumulado em toda a capital, Kazak viu uma necessidade de mudança e uma oportunidade.
“Tivemos a ideia de investir na situação e permitir que os refugiados sírios, especialmente as mulheres, ganhem uma vida digna e contribuam positivamente para as comunidades em que vivem”, diz Kazak.
“O projeto não só beneficia o Líbano... Ele também dá dignidade e uma chance para os refugiados mais vulneráveis”.
“Temos agora seis funcionárias sírias, todas refugiadas, cujas condições sociais e financeiras são muito difíceis. Estamos oferecendo um serviço social e ambiental ao mesmo tempo”, acrescenta.
A empresa também trabalha com empresas libanesas e enxerga a si mesma como uma empresa social, porque um dos seus objetivos é ter lucro ao mesmo tempo em que proporciona um serviço socialmente positivo.
Recycle Beirut treinou as seis mulheres na reciclagem e ensinou-as sobre seu propósito e importância. “Elas eram céticas no início, mas trabalhar aqui as ajudaram a se sentirem produtivas e o treinamento as encorajou a reciclarem seus próprios resíduos em casa”, diz Kazak.
A maior parte do salário de Gharam destina-se ao pagamento do aluguel da família. Apesar de ter um emprego e de receber 189 dólares em assistência alimentar por mês, ela continua lutando para dar conta das despesas.
“As coisas mudaram muito desde que saímos da Síria”, diz Gharam. “Lá, tínhamos um carro e uma casa totalmente equipada. Nossas crianças costumavam ir para a escola e aprender inglês”. Gharam fugiu de sua cidade natal, Ghouta oriental, com seus filhos em 2013.
Apesar das dificuldades, Gharam diz que está feliz. A oportunidade de trabalhar proporciona a ela uma sensação de segurança e esperança em um futuro melhor.