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Transpondo fronteiras por meio da natação

“Somos ‘chilombianas’. Viver aqui tem sido uma experiência muito boa. Nunca sofremos discriminações e as pessoas sempre nos acolheram”.

SANTIAGO, Chile, 05 de janeiro de 2017 – Todos os dias, seis vezes por semana, as irmãs González veem o dia nascer de dentro da água. Quando amanhece, elas já estão praticando natação na piscina olímpica do Estádio Nacional, localizado em Santiago do Chile. Trata-se de um local que as recebe todos os dias às seis da manhã, muito antes que a capital chilena já esteja completamente desperta. Ali, elas treinam por quase duas horas e em seguida se preparam para trabalhar ou estudar.

Elas aprenderam a nadar aos 6 ou 7 anos na piscina de um centro recreativo localizado em Cali, cidade ao sul da Colômbia, onde elas cresceram e viveram, mas que, por motivos de segurança tiveram que deixar para trás. Devido à complexa situação que se vivia na Colômbia, somada à perseguição de um dos membros de sua família, os González tiveram que embarcar em um avião que, a cada quilômetro sobrevoado, os deixava mais longe de seus entes queridos, mas ao mesmo tempo os aproximava de um novo país que lhes concederia refúgio. Desde então, passou-se quase uma década.

Foi assim que as irmãs González não tiveram outra opção a não ser continuar colocando em prática sua paixão pela natação no Chile, tornando-se assim companheiras inseparáveis. “Nos víamos todos os dias, íamos para a escola juntas e depois íamos para a piscina. Nos tornamos muito amigas e isso foi o mais bonito”, afirma Valentina, a irmã caçula. Atualmente, as duas participam de competições nacionais de alta performance.

“Somos chilombianas”, completa Natalia, a irmã mais velha que tem 20 anos. “Viver aqui tem sido uma experiência muito boa. Nunca sofremos discriminações e as pessoas sempre nos acolheram. Estamos adaptadas e temos amizades”, disse ela. A jovem, que em seu primeiro ano de universidade ganhou uma menção como melhor esportista, insiste que o esporte foi essencial para o processo de integração de sua família. “O ambiente da natação é muito acolhedor. Temos amigos e estamos perto de pessoas saudáveis. Isso te ampara, você não precisa de nada mais”. Atualmente, integram a família a mãe, um primo e suas duas irmãs.

No Chile, existem cerca de 2.000 pessoas refugiadas, sendo que dessas, estima-se que aproximadamente 90% sejam da Colômbia. Diante disso, as duas irmãs concordam que o esporte é essencial para o processo de integração local de seus compatriotas e de outros refugiados no país. “Quando praticamos esportes, não importa a sua idade, se você é homem ou mulher, qual a sua nacionalidade. Só importam os seus resultados e o seu rendimento. Acho que o esporte deveria ser incentivado entre as crianças refugiadas para facilitar a integração e retirá-los de situações de risco”, opina Valentina que, aos 18 anos, já representou o Chile na Copa Austral, uma competição internacional para esportistas chilenos, argentinos e uruguaios.

Porém, o esporte não foi o único fator importante para o processo de integração das irmãs. Depois que chegaram ao Chile, a família recebeu apoio do vicariato da Pastoral Social que, naquela época, era a agência do ACNUR no Chile e, posteriormente, pela Fundação de Ajuda Social das igrejas cristãs (FASIC), que atualmente desempenha o mesmo papel. Daquela época, elas se lembram com carinho de uma oficina de música que participaram e que trouxe a oportunidade de conhecer outros jovens refugiados da mesma idade, com os quais elas mantêm uma forte amizade até os dias de hoje.

No momento atual, ambas sonham em obter uma carreira universitária. Valentina estuda Administração Pública em um reconhecido centro de estudos chileno. Natalia, por sua vez, tem aspirações de se tornar uma grande especialista em cinesiologia e, por enquanto, divide seu tempo entre seu trabalho e sua preparação para o vestibular.

O mais importante de tudo é que as irmãs González seguem sendo amigas inseparáveis, e desejam continuar treinando para alcançar bons resultados esportivos para o Chile, país que abriu as portas para elas e sua família quando mais precisaram.

Por Stephanie Rabi, em Santiago, Chile.