Exposição no Museu do Amanhã revela o talento de artistas refugiados
Rio de Janeiro, 23 de setembro de 2016 (ACNUR) - Refugiados, sim. Mas antes e acima de tudo, artistas. Essa é uma das mensagens que a exposição "Horizontes Possíveis – Arte como Refúgio", com 11 obras de quatro artistas da Síria e da República Democrática do Congo, pretende transmitir ao público que for ao Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro.
Realizada pela Cáritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro e pela Humanitarian Research Art Platform (HARP), com curadoria do artista Felippe Moraes, a mostra valoriza o talento de artistas formados em academias de belas artes e de outros que descobriram sua força criativa recentemente, revelando a potência narrativa dos refugiados.
"Esta é uma exposição de artistas que porventura se tornaram refugiados", diz Moraes, que vê na arte uma forma de resistência. "Muitos desses artistas fugiram de perseguições políticas, guerras, e não podiam falar sobre a condição dos países deles. Aqui eles encontraram essa possibilidade", conta.
Ainda que fortemente inspirada na experiência do refúgio, a exposição protagonizada por esses "novos brasileiros", recém-chegados à Cidade Maravilhosa, de fato não se contenta em apenas olhar para o passado, mas discute o presente e vislumbra o futuro.
"O lugar que se deixou para trás nunca mais será o mesmo que ficou na memória, enquanto o lugar para onde vamos nunca será aquele que imaginamos", explica Moraes. "A grande premissa é como nós nos colocamos entre a expectativa, a memória e a realidade. A exposição funciona nessa lacuna, nesse espaço que ainda tentamos descrever para nele viver."
Nas obras do congolês Serge Kiala, criador de três telas e duas instalações, a África é onipresente, mas não como nostalgia. Tanto na colagem que exibe o continente envolto em uma corrente quanto na imagem de uma pomba afastada do mapa africano, Kiala chama atenção para o que está acontecendo agora. "É muito triste o que se passa na África hoje. O continente permanece aprisionado. Estou longe, mas me sinto como um embaixador da África aqui no Brasil", ressalta o congolês.
Seu compatriota, o ceramista Keto Kabongo, traz a dor da guerra na obra Os Conflitos, que exibe um osso de argila. "Muitas pessoas não sabem que o conflito mais mortífero desde a Segunda Guerra Mundial está ocorrendo agora no Congo", alerta Kabongo, que recentemente conseguiu emprego em um atelier de cerâmica.
O sírio Anas Rjab, por sua vez, buscou na culinária a inspiração para retratar seu país. "Fiz um mapa da Síria a partir de um pão sírio que eu mesmo assei, porque o trigo é o alimento básico do país e me recorda minha infância, passada em intermináveis campos dourados. Espero também retratar a grave escassez de comida que assola a Síria atualmente", explica Rjab, que se formou em engenharia, trabalha como chef de cozinha no Rio e se descobriu artista recentemente.
"Entrei nesse projeto inicialmente para chamar atenção sobre a causa dos refugiados, não apenas na Síria como em vários lugares onde as pessoas estão sendo forçadas a deixar suas casas", revela. "No final, tive minha voz ouvida, expus em um grande museu brasileiro e descobri meu talento cru e oculto."
Artistas refugiados mais do que refugiados artistas, portanto. "Espero que exposições como esta abram portas para eles, que eles continuem produzindo e que mais pessoas possam escutar sobre suas experiências", completa Moraes, que criou o grupo de estudos HARP (Plataforma de Pesquisa em Arte Humanitária, na tradução da sigla em inglês) justamente para abrir um espaço de discussão e expressão, de forma a fomentar a prática artística dos refugiados.
A mostra "Horizontes Possíveis – Arte como Refúgio", que reúne ainda fotografias da guerra síria organizadas por Ali Abdulla, foi lançada em 13 de setembro e ficará em cartaz até o próximo dia 25. Para visitá-la, é preciso comprar o ingresso que dá acesso à exposição permanente do Museu do Amanhã.
Por Diogo Felix, do Rio de Janeiro.