“Quem estuda não é o caderno, sou eu, aqui”

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Esta é a história de um daqueles momentos que marcam as nossas vidas e o nosso olhar sobre o mundo. É sobre um rapaz de 17 anos, da Guiné-Conacri, que se viu forçado pela guerraa abandonar os seus estudos e a vir para um novo e estranho país procurar paz e segurança, reconstruindo os pedaços destruídos do seu sonho. Chegou a Portugal em 2011, e, devido à idade, viu-se obrigado pelo sistema a esperar uma oportunidade para (re)começar a escola. E tudo o que ele mais queria era continuar a estudar! Surgiu, então, a possibilidade de frequentar uma formação em língua portuguesa numa escola secundária.Nunca me esquecerei de como o seu olhar brilhou quando lhe falei sobre as inscrições. Ficou tão entusiasmado! Dez minutos depois de eu ter falado com ele, bateu à porta de fato e gravata e o cabelo arranjado. Pediu um caderno e um lápis, pois não tinha nem uma coisa nem outra. Fui aos arquivos e procurei pelo material. Encontrei um lápis, uma caneta e um caderno, mas como este era cor-de-rosa com uma boneca na capa, continuei a procurar. Sem sucesso. Assim, subi e, timidamente, entreguei-lhe o lápis, a caneta e o caderno, acrescentando “lamento, mas não encontrei mais nada. Talvez depois consiga arranjar um novo caderno”. Ele sorriu, e, enquanto estendia os seus braços, disse: “Está perfeito. Quem estuda não é o caderno, sou eu, aqui”, apontando para a cabeça. “Muito obrigada”. E ali fiquei, vendo-o a partir com o seu sorriso e os seus sonhos. Guardei esta simplicidade como um exemplo. Hoje, quando me falam de refugiados, os meus pensamentos remontam inevitavelmente a este momento e associo o asilo à coragem, à determinação e à força de vencer.

Filipa Silvestre, Gabinete de Inserção Profissional (GIP/CPR)


by Filipa Silvestre, Portugal
posted: Wednesday, 4th June, 2014


Uma família destruída pela guerra já é demais

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